3 de junho de 2011

Existem Ateus? Causas e consequências do ateísmo

Traduzido por Luiz Carlos Martins Filho, Grupo S. Domingos de Gusmão.


1. Há ateus?


O ateu (do grego a, privativa e theos, Deus), é aquele que não crê na existência de Deus. Desta definição se depreende que não se podem classificar entre os ateus:


a) Aos indiferentes que, deixando de lado a questão das origens do mundo e da alma, vivem sem preocupar-se por seu destino. Ainda que esta maneira de ser pare praticamente no ateísmo, no entanto, os indiferentes na realidade não são ateus.


b) Os agnósticos, que proclamam que Deus está no domínio do incognoscível, tampouco podem chamar-se ateus; por mais tempo que permaneçam nesta afirmação, seu estado de espírito equivale a un ceticismo religioso.


c) Ainda menos se podem contar entre os ateus aqueles que estão em uma ignorância quase completa da questão religiosa, e que, ainda que façam profissão exterior de ateísmo, é porque crêem que esta atitude convém a espíritos fortes que não querem seguir ao vulgo, ou porque estimam que desta maneira hão de favorecer e fomentar melhor seus interesses materiais.


Logo, não se podem considerar como ateus mais do que os homens de ciência e os filósofos que, depois de um maduro exame das razões que há a favor e contra a existência de Deus, se pronunciam por estas últimas. Estes ateus, os únicos que merecem reter aquí nossa atenção, são seguramente um número muito pequeno; bastaria para prová-lo recordar o testemunho de um deles. “Em nossa época, escreve M. Le Dantec (O ateísmo), diga-se o que se queira, os ateus formam uma ínfima minoria”; mas há que ajuntar —para sermos justos— que, por outro lado, o número de agnósticos que pretendem que a questão é insolúvel cresceu em sérias proporções.


2. Causas do ateísmo


Geralmente se explica o ateísmo por razões intelectuais, morais e sociais.


a) Razões intelectuais


i. A incredulidade dos cientistas: físicos, químicos, biólogos, médicos, etc., deve atribuir-se freqüentemente aos seus preconceitos e à aplicação de um falso método. Com efeito, está claro que, se pretendem empregar aqui o método experimental que não admite senão aquilo que pode ser comprovado pela experiência, o que cai sob a ação dos sentidos, jamais poderão ultrapassar os fenômenos e chegar às substâncias. Observemos, ademais, que certas fórmulas das quais abusam para favorecer suas negações não são verdadeiras, ao menos no sentido em que as tomam. Quando eles alegam, por exemplo, que a matéria é necessária e não contingente, invocam para demostrá-lo a necessidade da energia e das leis. Mas se vê em seguida que a palavra necessária é equívoca. A necessidade, com efeito, é absoluta ou relativa. É absoluta quando a falta de existência implica contradição; e é relativa quando a coisa de que se trata, na hipótese de sua existência, deve ter esta ou aquela natureza, esta ou aquela qualidade: assim, uma ave deve ter asas, pois de outra maneira não seria ave. De que a energia e as leis sejam necessárias em sentido relativo, os materialistas fazem mal em concluir que a mesma matéria é o ser necessário no sentido absoluto.


ii. O ateísmo dos filósofos contemporâneos se deriva do criticismo de Kant e do positivismo de Augusto Comte. Segundo os críticos e os positivistas a razão não poder chegar à certeza objetiva, nem alcançar a substância por meio dos fenômenos. Erodindo assim a razão, arruinam-se ao mesmo tempo as provas tradicionais da existência de Deus. Podemos, pois, afirmar que na maior parte dos filósofos contemporâneos a crise da fé é, de fato, uma crise da razão; em nossa época, os negadores de Deus são também os negadores daquela nobre faculdade, mas esta, como acontece sempre contra as sentenças injustas, será um dia reabilitada e recobrará seus direitos.


b) Razões morais


Aduziremos entre as razões morais:


a. A falta de boa vontade. Se as provas da existência de Deus fossem estudadas com mais simplicidade e menos espírito crítico, haveria menos rebeldia contra a força dos argumentos. Tampouco se há de exigir das provas mais do que podem dar; sua força demonstrativa, ainda que real e absoluta, não leva consigo uma evidência matemática.


b. As paixões. É evidente que a fé se ergue ante às paixões como um obstáculo, mas quando uma coisa desagrada, sempre se encontram razões para suprimi-la. "Em um coração extraviado pelas paixões, diz Mons. Frayssinous, há sempre razões secretas para ter como falso o que é verdadeiro, facilmente se crê o que se deseja; quando o coração se entrega ao prazer que seduz, o espírito se abandona voluntariamente ao erro que justifica" e Paul Bourget, numa análise muito penetrante da incredulidade, escreve as seguintes linhas: "o homem que se desprende da fé dá sobretudo fim a uma cadeia insuportável a seus prazeres... Eu não surpreenderia a nenhum dos que tenham realizado os estudos de nossos liceus, ao afirmar que a impiedade precoce destes livre-pensadores com uniforme tem por ponto de partida alguma fraqueza da carne, acompanhada do horror à confissão. A razão - e que razão! - vem em seguida dar provas a favor de uma crise de negação aceita de antemão para as necessidades da prática".


c. Os maus livros e os maus jornais. Sob esta denominação não entendemos os livros e diários que são imorais, senão aqueles que, sob pretextos e dissimulações, atacam tudo o que há na base da moralidade e querem fazer crer, em nome de um pretenso progresso e de uma falsa ciência, que Deus, a alma e a liberdade, não são mais que palavras que servem de vestimenta a puras quimeras.


c) Razões sociais


Assinalemos somente:


a. A educação. Não é exagerado dizer que as escolas neutras [n.t. laicas, em oposição às escolas católicas] tenham sido para o ateísmo um terreno de cultivo excepcional; tomada em conjunto, nossa sociedade vai em direção ao ateísmo porque assim o quer;


b. O respeito humano. Muitos tem medo de parecerem religiosos porque a religião não goza já da simpatia [das pessoas], e pelo temor de cair no ridículo.


3. Conseqüências do ateísmo


O ateísmo, ao suprimir Deus, tira todo o fundamento da moral; daqui provêm as mais graves conseqüências para o indivíduo e para a sociedade.


a) Para o indivíduo


i. O ateísmo o entrega sem freio às suas paixões. Se o homem não reconhece um soberano que tenha poder de lhe preceituar o bem e castigá-lo pelo mal, por que não se deixará levar pelos seus desejos e não correrá atrás da felicidade terrestre, ou ao menos atrás daquilo que ele acredite como tal, por qualquer classe de meios?


ii. Mais, pelo contrário, o ateísmo tira do homem todo consolo no meio das provas da vida; aquele que não crê em Deus deve recusar toda esperança de consolação quando a vida se torne amarga e a terra lhe negue as alegrias que ele lhe pediu.


b) Para a sociedade


As conseqüências do ateísmo são ainda mais ruinosas para a sociedade. Ao suprimir as idéias de justiça e responsabilidade, leva até o despotismo e à anarquia, substituindo o direito pela força. Se os governantes não crêem haver acima de si um Senhor que lhes pedirá contas de sua gestão, estarão livres para governar a sociedade segundo seu capricho. "Eu não queria, afirmava Voltaire, ter contas com um príncipe ateu que mostrasse interesse em fazer-me triturar num pilão, porque estou certo de que me trituraria". Por outro lado, em toda sociedade há distâncias entre seus membros, sob o ponto de vista da hierarquia, de dignidades, de honras, de situação e de riquezas; se não existisse Deus para recompensar um dia aos que, menos favorecidos, aceitam seu destino com valor e cumprem seu penoso dever, por que não rebelar-se contra uma sociedade tão mal organizada e reclamar-lhe imperiosamente sua parte de felicidade e prazeres?


A. Boulenger
(Tomado do “Manual de apologética”, Introducción a la doctrina católica)


Fonte: http://fsspx-sudamerica.org

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